Sinopse: Imbuída de um erotismo inusitado, esta obra, escrita em 1961, demonstra a maturidade estilística do autor, que se utiliza de sua virtuose descritiva para contar a história de Eguchi, um senhor de 67 anos que frequenta a "casa das belas adormecidas", uma espécie de bordel onde moças encontram-se em sono profundo, sob efeito de narcóticos. Apesar da idade avançada, o protagonista parte em busca dos prazeres perdidos e se depara com moças virgens, que os visitantes podem tocar, mas são proibidos de corromper. Daí derivam passagens antológicas de rememorações pessoais e fantasia. Kawabata procura desvendar o enigmático universo do corpo feminino em um culto ao belo e ao inalcançável, investigando as dores da solidão a partir da sutileza de um erotismo expressivo, constantemente atravessado por passagens de fina ironia e perturbadora consciência da passagem do tempo, do vazio existencial que permeia as relações humanas.
Resenha/Opinião: Eu realmente gosto de ser surpreendido nesse mundo tão vasto da literatura mundial. É sempre bom conhecer diversos tipos de escrita e uma que sempre me chamou atenção foi a oriental. Mesmo não conhecendo Yasunari Kawabata e seu "A Casa das Belas Adormecidas", posso dizer que fiquei impressionado com sua escrita e a história também, claro, mesmo que em alguns pontos eu tenha ficado um tanto indignado com as situações, não posso dizer que essa literatura não é boa, pelo contrário, mas para alguns, certas situações podem até gerar um certo desconforto ou até mesmo polêmica.
Em "A Casa das Belas Adormecidas", acompanhamos a narrativa em primeira pessoa do velho Eguchi, que por indicação de um amigo, foi conhecer a tão falada casa. Mais por curiosidade do que por necessidade, pois o velho Eguchi, mesmo não admitindo, sentia que precisava de algo diferente em sua vida. Tendo sido recepcionado por uma mulher e ali mesmo na recepção da casa, tomado conhecimento das regras que deveria cumprir sob pena de não ser mais aceito no lugar, o velho Eguchi quase como sem se importar, dando um ar meio insolente para toda aquela situação, foi se embrenhando no ar daquele local, que com certeza, era além de abastado, proibido.
Entrando num recinto fechado e com janelas protegidas por cortinas grossas e vermelhas, o velho Eguchi, pode ver a garota que estava deitada lhe aguardando; completamente nua e desacordada. A velha da portaria disse que as mulheres não poderiam acordar, nem que ele tentasse, pois todas elas tomavam um forte remédio para dormir para que seus "companheiros" de cama pudessem ficar bem relaxados e à vontade.
"Temendo apesar de tudo despertar a garota, embora soubesse que isto não iria acontecer, deslizou cuidadosamente para baixo da coberta. Notou que ela não usava nada no corpo."
É nesse ponto que as coisas começam a ficar realmente um tanto estranhas e abusadas. A escrita de Kawabata é muito fluída e aconchegante, como costumo dizer, ele consegue relatar fatos cotidianos da vida de seus personagens de uma forma que não fique maçante ou enfadonho. Porém, é no absurdo das situações que começamos a ficar até, enojados.
Kawabata não chegar a tratar o erotismo e o desejo com leviandade, longe disso, fica muito claro em várias situações em que o velho Eguchi se encontra em que esses temas são tratados com seriedade, mas se nas lembranças do personagens nós encontramos, como disse, a seriedade e também o respeito, é no presente dentro da casa, que a coisa toda muda de figura.
Até onde pude ver, nesses anos todos de leituras e cinefilia, a mulher sempre foi tratada de uma forma subserviente ao homem e no oriente, essa impressão [ou realidade, mais correto dizer] fica ainda mais evidente. Kawabata, faz uma demonstração de uma prostituição passiva, mesmo que celibática [se é que isso existe], onde as mulheres são, literalmente, drogadas para passar a noite com velhos que não têm mais vida sexual para serem tratadas da forma que seus companheiros quiserem; mesmo que obedecendo, como disse, algumas regras básicas e de "segurança" para elas.
A insegurança fica por conta do leitor, pois é através do velho Eguchi e de seus pensamentos divagadores que traz uma sensação de que algo sempre está por acontecer com essas belas adormecidas. Existem certas cenas que a angústia do leitor chega a ser insustentável; e, por isso mesmo, "A Casa das Belas Adormecidas" é uma leitura estrondosa, pode-se dizer.
Kawabata ainda nos apresenta, segundo a sua visão e experiência, claro, pois o autor se suicidou em 1972, os sentimentos da velhice para um homem oriental e respeitoso como seu personagem Eguchi é apresentado. Nesse ponto, o autor deixa claro suas mágoas, inseguranças, medos e também críticas à sociedade em que viveu.
Portanto, é através dessas experiências do velho Eguchi, que conhecemos também um pouco mais de seu passado, pois a cada visita e a cada bela adormecida, seus pensamentos lhe trazem lembranças de suas experiências, principalmente com seus amores, sejam "oficiais" ou não. É exatamente nessa mescla de presente e passado que a brutalidade do presente e a leveza do passado, nos traz uma experiência um tanto fora do comum, pois como disse, ao mesmo tempo que não podemos aceitar situações como as descritas na história, não deixa de ser intrigante e até mesmo "interessante" [sim, com suas devidas aspas] ver até onde a exploração feminina vai ser levada.
Eu acredito que a literatura de Kawabata deve ser sim conhecida por aqueles que não se deixam limitar por situações constrangedoras e até mesmo inconcebíveis, pois são nessas mesmas situações que conhecemos nossos limites, reafirmamos nossas crenças e adquirimos conhecimentos e experiências. Então, se você se encaixa nesse perfil, tenho certeza que vai ter uma experiência e tanto com "A casa das Belas Adormecidas", publicado pela editora Estação Liberdade, no formato brochura com uma belíssima capa, fonte agradável e impecável projeto editorial. Sem dúvida alguma, I.M.P.E.R.D.Í.V.EL.
Autor: Yasunari Kawabata, Prêmio Nobel de 1968, é considerado um dos representantes máximos da literatura japonesa do século XX. Nascido em Osaka em 1899, tornou-se órfão ainda criança e interessou-se por livros, principalmente os clássicos japoneses, desde a adolescência. Acompanhado de jovens escritores, defenderia mais tarde os ideais da corrente neossensorialista (shinkankakuha), que visava uma revolução nas letras japonesas e uma nova estética literária lírica, impressionista, atravessada por imagens nada convencionais. Ao contrastar o ritmo harmônico da natureza e o turbilhão da avalanche sensorial, Kawabata forjou insólitas associações e metáforas táteis, visuais e auditivas que surpreendem por revelar os processos de fragilização do ser humano diante do cotidiano, numa composição surrealista de elementos da cultura e filosofia orientais, personagens acuados e cenários inóspitos. Sua obsessão pelo mundo feminino, pela sexualidade humana e pelo tema da morte (presente em sua vida desde cedo, sob a forma da perda sucessiva de todos seus familiares) renderam-lhe antológicas descrições de encontros sensuais, com toques de fantasia, rememoração, inefabilidade do desejo e tragédia pessoal. Desgastado por excesso de compromissos, doente e deprimido, Kawabata suicidou-se em 1972.
Ficha Técnica:

Autor: Yasunara Kawabata
Tradução: Meiko Shimon
Editora: Estação Liberdade
Páginas: 126
Ano: 2019
ISBN: 9788574480985
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