[RESENHA #058] O VERMELHO E O NEGRO | STENDHAL


Sinopse:
 
Stendhal, pseudônimo de Marie-Henri Beyle, torna-se um escritor de cunho realista a fim de expressar seu mal-estar diante do mundo pós-napoleônico. O Vermelho e o Negro, publicado em 1830, é um romance histórico e psicológico que se passa na França, durante a restauração. Dividido em duas partes, a primeira nos apresenta Julien Sorel, um jovem imprevisível e ambicioso que vive na pequena cidade de Verrières. A segunda parte narra a vida de Sorel em Paris. Com personagens intrigantes e enigmáticos, Stendhal nos revela as condições econômicas, a situação política e a estratificação social desse período francês.

Resenha/Opinião: É muito bom saber que existem clássicos que mesmo após quase dois séculos ainda impressionam. O Vermelho e o Negro de Stendhal nos mostra uma França ainda meio perdida após a era Napoleônica. Julien Sorel é um personagem extremamente marcante por sua complexidade em uma época de mudanças e onde ainda havia muitos problemas a se resolverem. 

Se na primeira parte do romance histórico de Stendhal, temos um jovem Sorel ambicioso, orgulhoso e também raivoso pela sociedade em que está inserido, que comete erros até aprender o necessário para subir em sua posição; na segunda parte, vemos um Julien mais experiente e, apesar de ainda ser jovem, com seus objetivos mais claros, diretos, mais calculista e que usa tudo que aprendeu sobre o materialismo e toda a nobre hipocrisia da sociedade francesa. 

Ainda vemos um homem jovem com sua ambição secreta, mas que pela mesma ambição, tem que escolher uma carreira que também lhe dará um futuro certo e vantajoso, mesmo que não seja aquilo que sempre desejou e que esconde por medo da nova sociedade que trava uma guerra, que se estende entre os nobres e a burguesia, além dos jansenistas e os jesuítas. Toda a reestruturação da França, pouco antes da revolução de 1830, serve de pano de fundo para o árduo caminho que o personagem principal precisa percorrer para conseguir aquilo que tanto sonha.


Stendhal faz uma profundíssima crítica social criando uma gama de personagens que conseguem demonstrar a futilidade, a vilania e a hipocrisia, além da ganância e o falso moralismo de uma época regada de tradições calcadas em muitas injustiças e traições. 

O Vermelho e o Negro nos mostra vários personagens com seus discursos moralistas e politicamente corretos para a sociedade da época, mas que no fundo não passam de palavras vazias que servem apenas para inflar egos e reputações que sobreviviam apenas pelo mais puro "puxa saquismo" daqueles que eram os donos do dinheiro. 

A reputação das pessoas era tão ridiculamente frágil que bastava apenas um acontecimento ou até mesmo palavras comprometedoras jogadas "ao vento", para que qualquer um passasse de bem visto, querido, invejado e de boa índole para um mal caráter ou persona non grata; tudo era aparência e dinheiro e, nesse ponto, Stendhal nos mostra maravilhosamente como a sociedade era mesquinha e cruel, ainda mais em um período de reestruturação como foi o da França.


Mas nem tudo é crítica, pois o amor também não fica de fora dessa bela jornada. Mesmo sendo apresentado de uma forma complexa, muitas vezes inconstante e quase sempre equivocado, ele, o amor, tem seus momentos puros e emocionantes através dos poucos amigos que o jovem Sorel conquistou ao longo dos anos. É através desse amor fraternal que enxergamos a esperança do ser humano que faz o que for preciso e é capaz de largar tudo e mover montanhas apenas para ajudar um amigo.

Julien Sorel é um dos personagens mais complexos que eu já tive o prazer de conhecer e através das palavras de Stendhal em O Vermelho e o Negro, Sorel será inesquecível tanto por seus dilemas intelectuais, políticos ambiciosos e religiosos como também pelos dilemas amorosos sofridos que muitas vezes o tiraram de seu caminho à ascensão.

O Vermelho e o Negro é um romance brilhante e que ainda nos dias de hoje, como disse antes, quase duzentos anos depois de sua publicação, continua a impactar aqueles que deitam os olhos por suas mais de quinhentas páginas de puro deleite e dissecação de uma época extremamente conturbada e que de certa forma ainda é tão atual que chega a nos assustar bastante.


A edição de O Vermelho e o Negro foi concebida para ser diferente. A Martin Claret aproveitou o conceito de tipografia e o aplicou inteiramente na capa do livro de Stendhal, sem se utilizar de qualquer arte gráfica e se apoiando, como disse acima, totalmente na tipografia, teve a competência de criar uma capa muito bonita e elegante. Essa mesma elegância se choca com a forma rústica da capa sem revestimento nas laterais e com as costuras da lombada à mostra, o que deixou essa edição além de linda, única. 

Talvez seja um dos únicos livros no mercado em que você pode, com tranquilidade, abrir em qualquer página e deixá-lo no ângulo de 180º, sem medo de descolar páginas, arrebentar lombada nem nada. O cuidado fica apenas nas bordas, pois como não têm revestimento, são um pouco mais delicadas. Porém, o cuidado que se precisa ter com essa edição é o mesmo de qualquer outra que existe nas livrarias ou aí na sua estante.

Lembrando que essa edição é em capa dura, folhas amareladas e impressa em fontes bastante agradáveis. Outro detalhe são as notas explicativas que são impressionantes tanto na quantidade quanto na qualidade de informações que agregam a edição e que ficou a cargo do próprio tradutor, Herculano Villas-Boas. A revisão ficou por conta de Alexander Barutti Siqueira e do inigualável Oleg Almeida. Pode-se dizer que a Martin Claret apostou e arriscou-se em um design diferente de seu "modus operandi" e acabou criando uma obra belíssima que vai agradar tanto em beleza quanto em conteúdo. 

Fico feliz em dizer a todos vocês que O Vermelho e o Negro de Stendhal, publicado pela editora Martin Claret não é de forma alguma imperdível, pois na verdade é sim, O.B.R.I.G.A.T.Ó.R.I.O.


Autor: Henri-Marie Beyle, mais conhecido como Stendhal, nasceu em Grenoble, França, em 23 de janeiro de 1783. Foi cônsul e diplomata francês, mas ficou mais conhecido por ser escritor. Tinha um estilo mais seco, mas também se utilizava da valorização de sentimentos, paixões e aspectos psicológicos para construir seus personagens. Dentre suas obras mais famosas se encontram O Vermelho e o Negro e A Cartuxa de Parma. Stendhal faleceu no dia 23 de março de 1842 em Paris, França.


Ficha Técnica:
Título: O Vermelho e o Negro
Autor: Stendhal
Tradutor: Herculano Villas-Boas
Editora: Martin Claret
Páginas: 512
Ano: 2018
ISBN: 9788544001653

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