[RESENHA #050] SHIRLEY | CHARLOTTE BRONTË


Sinopse:
 
Shirley narra a história da complicada amizade entre duas mulheres muito distintas: Shirley, a corajosa herdeira e Caroline, a tímida filha de um clérigo. Considerado um dos romances mais inovadores de Charlotte Brontë, Shirley está à frente de seu tempo em termos de forma, atualizando a tentativa de compreensibilidade que se tornaria comum na literatura do século XX. A autora apresenta uma ferramenta narrativa que foi largamente utilizada posteriormente, a fragmentação, tornada possível pelo uso de um narrador em terceira pessoa, além da divisão da função de protagonista em duas personagens distintas. Uma obra-prima que merece ser conhecida e apreciada.

Resenha: Quem não tem na família aquela pessoa que quando você vai visitar ou algo que o valha, te chama para contar umas histórias? Sabe aquela sensação de se sentar em um sofá num ambiente igualmente aconchegantes e se deliciar com uma boa e longa história? É exatamente assim que me senti quando comecei a leitura de Shirley de Charlotte Brönte, nesta edição tão bonita da Martin Claret.

O romance tem muitos pontos positivos, mas um que realmente me chamou a atenção é a participação da personagem Shirley. A autora cria todo um ambiente, apresentando diversos personagens e em determinado momento, o leitor acaba por se perguntar: E a Shirley?


É muito interessante como Charlotte criou um romance onde a personagem que dá nome a trama aparece somente depois de mais de duzentas páginas. Ficou claro que a intenção foi a de “prender” o leitor na história de uma forma que não houvesse qualquer outra opção a não ser continuar até o final de suas oitocentas páginas. Simplesmente genial, e digo, leitores, vocês vão querer continuar a acompanhar as diversas direções que os personagens têm ao longo da trama de Shirley. E, claro, Charlotte Brontë não poderia deixar de honrar o legado da família mais famosa de escritoras da literatura mundial e, assim como seus outros romances, destila suas críticas sociais, religiosas e principalmente o papel da mulher naquela sociedade.

Shirley é o símbolo da mulher independente, resoluta, caridosa, justa, inteligente e principalmente livre de quaisquer preconceitos. Acredito que esta personagem deve ter dado o que falar na época de sua publicação, pois o injusto papel da mulher naquela sociedade se restringia a ser uma dona de casa com diversos atrativos praticamente inúteis em uma vida comercial como era a dos homens. Bordado, aulas de música, vestimenta impecável, religiosidade e obediência, tanto a Deus quanto ao homem, era sempre o que se esperava de uma moça da sociedade naquela época.


É nesse ponto que a autora estapeia a sociedade patriarcal e machista, apresentando uma personagem que além de todos os atributos femininos se sai muito bem em todos os assuntos “relegados” ao comportamento masculino. Existem cenas em que o leitor saboreia a luta verbal entre a mulher, representada por Shirley, e o homem, aqui representado muitas vezes por seu tio e outros, onde é demonstrada toda a hipocrisia da já referida sociedade. Gratificante demais ver uma personagem que não se rebaixa perante o ser “dominante” e ainda consegue defender suas opiniões e ações de forma clara e direta.

Shirley é um romance onde a religiosidade é muito presente, como era comum naquele período, mas isso não quer dizer que Charlotte tenha deixado de lado suas críticas, pelo contrário, ao mesmo tempo em que a questão espiritual é apresentada, em muitos momentos é duramente criticada por ações ou opiniões diretas de seus personagens ao longo de toda a história. Mas Shirley também é um romance como outro qualquer, onde temos personagens apaixonados e que lutam pelos seus amores e outros que fazem exatamente o inverso. Ao longo de toda a trama, que tem como pano de fundo a recessão que assolava todo o país devido a guerra e o embargo das exportações, Brontë, dilui todo o romance de seus personagens que caminham entre cenas de invasões, roubos, tentativas de assassinato, pobreza, fome entre outras mazelas. Mas também encontramos o seu correlato nas ações de caridade, amizade, amor ao próximo e até algumas situações familiares que surpreendem o leitor, principalmente pela época em que é apresentada tais situações.


Shirley de Charlotte Brontë pode não ser um romance muito conhecido entre os leitores no Brasil, mas essa história cumpre muito bem a função de entretenimento pela qual foi criada. A sensação que tive enquanto acompanhava a trama, foi idêntica quando você acompanha uma novela ou uma série com seus personagens sofrendo, amando, lutando e enfrentando todas as situações de uma maneira coerente e aconchegante. Talvez a melhor palavra para se explicar Shirley seja exatamente essa: aconchegante.

Indiscutivelmente, pelo menos para mim, Shirley foi uma experiência muito boa, gostosa mesmo, pois o prazer de se sentir naquele sofá e ambiente confortáveis era automático assim que eu abria o livro para continuar a leitura. Realmente, foi uma surpresa muito boa que com absoluta certeza, vou querer repetir. Ainda mais com essa nova edição em capa dura que a editora nos presenteou. A ilustração define muito bem o romance e ainda vem com pintura trilateral, ótima fonte, papel pólen, fitilho e ilustrações a cada início de capítulo. Meu conselho para os leitores e leitoras que muitas vezes se sentem intimidados por romances muito volumosos, pelo menos quanto a Shirley, é que deixem de lado esse “medo” e aventurem-se, pois, felizmente, Shirley de Charlotte Brontë, publicado pela Martin Claret é I.M.P.E.R.D.Í.V.E.L.


Autora: Charlotte Brontë foi uma escritora e poetisa inglesa, a mais velha das três irmãs Brontë que chegaram à idade adulta e cujos romances são dos mais conhecidos da literatura inglesa. Nasceu em Thornton, oeste de Bradford, West Yorkshire, Reino Unido no dia 21 de abril de 1816. Escreveu o seu romance mais conhecido, Jane Eyre com o pseudônimo Currer Bella.

Charlotte era a terceira dos seis filhos nascidos de Maria Branwell e Patrick Brontë, um pastor anglicano de origem irlandesa. Em 1820, a família mudou-se para uma aldeia a alguns quilômetros de Haworth, onde Patrick tinha sido nomeado coadjutor perpétuo na Igreja de São Miguel e Todos os Anjos. A mãe de Charlotte morreu de cancro no dia 15 de Setembro de 1821, deixando as suas cinco filhas e o filho aos cuidados da sua irmã, Elizabeth Branwell.


Ficha Técnica:
Título: Shirley
Autor: Charlote Brontë
Tradução: Solange Pinheiro
Editora: Martin Claret
Páginas: 801
Ano: 2022
ISBN: 9786559100033

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